CRATO PERDE MAIS UM DOS SEUS ÍCONES – FALECEU ALEXANDRINO DAS NEVES CARVALHO

 O Crato ficou mais pobre com a perda de um dos seus ícones do século XX com a morte de Alexandrino das Neves Carvalho, no dia 25 de agosto de 2016, com 86 anos de idade. Alexandrino Carvalho, Alex para os amigos mais chegados, foi um dos cratenses mais dedicados à terra e aos outros durante a sua longa vida ativa. Ligado à Misericórdia do Crato na velhinha Farmácia da Misericórdia desde os 19 anos de idade e quase ao longo de 50 anos, o Alex e a sua esposa D. Narcisa Damas, tia paterna do nosso maestro Humberto Damas, constituíram uma dupla de enorme relevo no Crato e seu concelho pelo bem que fizeram a centenas de pessoas através das suas qualidades técnicas de enfermagem e não só. Estavam sempre disponíveis para acorrer a todos fossem de que condição social fossem…Por estas e muitas outas razões, são personalidades muito estimadas no Crato, o que ficou comprovado com o enorme funeral que acompanhou o Alex à sua última morada no cemitério do Crato, pese embora estar o Crato em festas e “toda a gente” se deitar tarde e o funeral ser logo pela manhã. A sua vida foi sempre ligada ao velho Hospital de Crato, não só pelo serviço na Farmácia como também nos serviços de enfermagem, era quase a sua morada, inclusivamente construiu a sua residência no local mais próximo disponível e, quis o destino, que terminasse os seus dias, que foram difíceis e de muita revolta, precisamente no local onde passou quase toda a sua existência – O Lar de Grandes Dependentes/Unidade de Apoio Integrado (UAI) – exatamente o espaço do antigo Hospital do Crato.

Por força da importância que Alexandrino Carvalho tinha para o Crato, a Filarmónica do Crato associou-se às suas exéquias fúnebres na manhã de 26 de agosto (já na véspera fizera o mesmo com um seu diretor) participando nas mesmas com a Banda a tocar o tema fúnebre que tantas vezes o Alex ouviu ao longo da sua existência nas festividades da Semana Santa – “Suspiro”. Sabíamos que era seu desejo ter a Banda a acompanhá-lo à sua derradeira morada. E tratando-se de um homem de exceção, a Filarmónica do Crato abriu uma mesma exceção ao seu Regulamento Interno e compareceu visto o Alex não ser, à data, membro da Banda ou dos seus corpos sociais. No entanto, como a sua vida foi muito mais para além do que atrás já foi citado, o Alex encimava grupos de apoio a eventos, a associações, promovia excelentes excursões em Portugal, nas ilhas e até no estrangeiro, participava com rigor em todas as atividades religiosas e da paróquia e participou nos corpos sociais dos Bombeiros e da Banda, entre outras. E foi precisamente Alexandrino Carvalho um dos pilares do grupo de estimados cratenses, dos quais só já resta vivo o Sr. Engº João Henrique Satyro de Castro Antunes, que em 1970 impulsionaram a então Banda Municipal Cratense, que vivia anos de menor atividade e organização, criando uma direção e contratando o maestro João Imperial. Não só reativaram a Banda como a deixaram consubstanciada no ano de 1976 à então direção onde já figurava o nosso mítico Presidente, José Belo ou José da Conceição Belo – Zé Foguete – pai do nosso atual Presidente Filipe Lopes, que vai pelas pisadas do pai mas ao seu estilo. Alex e Zé Foguete eram amicíssimos e faziam férias juntos.

Por outro lado, a grande amizade que existia entre o falecido e a Filarmónica do Crato materializava-se, ano após ano, desde que construiu a sua casa, até aos mais recentes anos, numa tradição que durou perto de quatro décadas (até 2011), com a receção que todos os anos o casal Alex e Narcisa fazia à Banda na manhã de 8 de dezembro aquando da sua tradicional arruada pelas ruas da vila. No Codeço, os músicos aqueciam a alma com umas gotas dos melhores licores e vinhos que o Alex disponibilizava sempre com enorme alegria e carinho e aconchegavam as barrigas com bolos, bolachas e biscoitos. Havia um conforto de barriga e outro de alma ao observarmos o seu brilho nos olhos por ver a Banda com saúde e acompanhando a entrada de todos os seus novos elementos ano após ano. A verdade é que o nosso amigo recebeu a Banda pela última vez, em 2011 sendo que tanto nesse ano como no anterior já manifestava debilidade física e a consciência de que era difícil estar no ano seguinte. E alguma vez tinha de ser…

Eis as fotos tiradas em 2010 e 2011!

New Picture (3)

2016-08-28_215636

2016-08-28_215839

Infelizmente, em 2012 já não nos pôde receber – “Quem não estava para nos receber (pela primeira vez em perto de 40 anos) foi o amigo Alex (Alexandrino Carvalho), que se encontra a recuperar de uma cirurgia à coluna. Foi com enorme tristeza que não pudemos “matar o bicho” como é hábito. Esperamos, sinceramente, que o Alex ainda nos possa receber durante mais uns anos e que recupere desta delicada intervenção cirúrgica.”

Em 2013 visitámos pela primeira vez o Alex na UAI – “Em seguida a banda veio para o Crato e arruou até ao Bairro do Codeço onde tinha como missão ir prestar homenagem aos idosos que se encontram na UAI da Santa Casa da Misericórdia, em especial ao seu utente Alexandrino das Neves Carvalho. Esta visita foi tratada com todo o cuidado a pedido de alguns músicos mais velhos que não esquecem esta figura do Crato, este grande amigo da Banda. Alexandrino Carvalho foi um homem muito importante para a reativação que a Banda teve nos finais dos anos sessenta e princípios de setenta, que como é sabido, a banda tocava mas estava um pouco desorganizada e sem Diretores e o Alex foi um dos carolas que colocou mãos à obra para que a Banda tivesse as condições que tem hoje, passados pouco mais de 40 anos. Por outro lado, o Alex fez questão de receber a “sua” Filarmónica do Crato em sua casa durante 35 anos ininterruptos nesta manhã alusiva à padroeira, que tanto venera mais a sua esposa Narcisa Damas, a quem agradecemos ter permitido visitarmos o marido na UAI visto existir algum receio por uma emoção como esta ser prejudicial à saúde do Alex. Infelizmente, este ano foi o segundo em que, por razões de saúde este nosso grande amigo não nos pôde receber na sua garagem, mas fica a memória e o desejo de que isso ainda possa vir a acontecer. Foi, com certeza, um momento bastante emocionante para os visitantes e visitado, que foi surpreendido.”

2016-08-28_215955

Em 2014 voltámos à UAI pelo segundo ano consecutivo e terceiro sem paragem na garagem do Alex – “De resto, a Filarmónica fez a sua habitual arruada passando pelos pontos que já vão sendo um hábito de há uns anos a esta parte, nomeadamente, a Unidade de Dependentes de Longa Duração da Santa Casa da Misericórdia, onde pudemos rever o Alex e a Narcisa, que tantos anos lá passaram a servir e a fazer o bem a todos e agora é a vez de serem eles a ser tratados por outros…Infelizmente, já não se cumpre a tradição de mais de 30 anos, que era visitar a adega do Alexandrino. Mas o que importa foi vê-lo com um brilho nos olhos a ouvir o Hino da Padroeira!”

2016-08-28_220107

Por fim, em 2015, a Banda foi à UAI mas antes parou à porta do Alex onde foi recebida pela esposa Narcisa Damas e o Presidente Filipe teve a feliz ideia de explicar aos músicos mais novos da Banda a razão de pararmos a homenagear os donos daquela residência. – “Entretanto, deu-se a passagem pela Unidade de Acamados da Santa Casa da Misericórdia sem que antes se cumprimentasse a “enorme” cratense, Narcisa Damas, à porta de sua casa. Casa essa que, durante mais de 30 anos, se abriu para cumprimentar os músicos oferecendo um retemperador descanso e algumas iguarias e bebidas de aquecimento para atenuar o frio que marca sempre presença neste dia. O presidente da direção aproveitou para explicar aos executantes mais novos o porquê do cumprimento à esposa do amigo Alex informando-os sobre as paragens “técnicas” que a banda ali fazia tendo ainda explicado que Alexandrino Carvalho, foi um dos principais responsáveis pela reativação da banda em finais de 1970 aquando da vinda para o Crato do maestro João Imperial. Na UAI, brindámos os utentes e funcionárias com o hino de Nª Srª da Conceição, tema que diz muito à maioria dos presentes não tendo faltado quem se emocionasse facilmente. Quanto ao Alex, parece estar bem, mas “afastado” de tudo. “

2016-08-28_220215

2016-08-28_220310

Infelizmente, no dia 8 de dezembro já não poderemos cumprimentar o Alex na UAI, mas estou convicto de que enquanto houver lembrança entre os músicos e os diretores com maior longevidade na Banda, certamente que à sua porta a sua memória há de ser lembrada por muitos anos. Paz à sua alma e condolência à menina Narcisa, à filha e ao genro, bem como aos netos e demais familiares (sobrinhos), incluindo o nosso maestro Humberto!

 

Deixar comentário